6 de setembro de 2020

Empatia

Empatia, palavra mágica destes tempos de tantos laços quebrados, outros ensaiados, muitos desejados, muitos impossíveis. Na secção de Opinião de The New York Times, Molly Worthen, professora de História e jornalista freelance, escreve sobre os dramas da empatia em cenário de pandemia ['The Trouble With Empathy']. Artigo obviamente mobilizador que nos recoloca perante os modos que nos levam, ou não, a reconhecer as singularidades dos outros. Mais ainda: perguntando que modelos de pedagogia, nomeadamente na escola, nos podem abrir portas para tais singularidades— o artigo apresenta mesmo uma sugestiva entrada: "Podemos realmente ser ensinados a sentir a dor de cada um dos outros?"
Começando por referir as experiência por que está a passar a sua filha no jardim infantil, Worthen destaca a importância dos livros na construção da empatia, isto é, no conhecimento e reconhecimento da história irredutível de cada ser que nos surge como estranho, ou melhor, exterior ao nosso universo. Celebrando o primitivo e maravilhoso acto de leitura, portanto.
E, no entanto, tudo isto parece decorrer da análise de um universo em que o livro se apresenta como elemento "natural" de uma cultura global subtitamente esvaziada do assombramento social das "redes". A explanação desenvolve-se, assim, omitindo o facto de vivermos num mundo que, através de milhares de milhões de polegares ao alto, impôs a mais agressiva ilusão empática: dispondo do mapa etéreo de infinitos links virtuais, teríamos encontrado a comunicação automática e ideal, fundando uma comunidade de empatia universal, cândida e irrevogável. Ainda que com intenso e comovente amor pelos livros, como é possível pensar a nossa relação com o outro, ignorando isto?